Aldeia Sesc promove domingo de delicadezas, dramas e música brasileira

27/10/2013 às 00:00 por Viviane Franco

 O Centro Histórico de São Luís ganhou no domingo passado (27) uma atmosfera poética por conta da programação da 8ª Aldeia Sesc Guajajara de Artes. Espetáculos infantis, peças teatrais e apresentações musicais atraíram para os principais teatros e Praça Nauro Machado um público desejoso por cultura e arte.

 

Na Sala de Coro do Teatro Arthur Azevedo, a Cia. Gente Falante, do Rio Grande do Sul, ofereceu um momento de pura delicadeza no final da tarde com o espetáculo infantil “Louça Cinderella”, uma adaptação da conhecida estória da Gata Borralheira, escrita no século XIX pelos Irmãos Grimm e Charles Perraut, e convertida em teatro narrativo com objetos.

 

O ator-manipulador Paulo Martins começa dizendo: “Ninguém está só para sempre. Valorize os momentos de encontro”. Usando uma pequena mesa como palco, ele convida a todos a entrar na fantasia do faz-de-conta ativando a memória e a ludicidade de adultos e crianças. Xícaras, bules, louças e outras porcelanas vão servindo de personagens na contação da história. Depois do final feliz, todos são servidos com chá de pêssego e deliciosos biscoitos.

 

“Louça Cinderella” vai além de um simples conto de fadas. O texto fala de encontros entre pessoas, diferenças sociais, a importância de valorizar o conteúdo das pessoas além das aparências, das pequenas delicadezas afetivas, sintetizado na metáfora do hábito cordial britânico de oferecer o chá das cinco.

 

Paulo explicou que a ideia para o espetáculo veio a partir das memórias de sua avó. Uma mulher inglesa que casou com um negro africano para sair de casa. O casal foi morar na Bahia e por muito tempo ela não conseguia demonstrar afeto entre os familiares. Transformar o chá das cinco em hábito cotidiano e generoso foi a maneira que ela encontrou de se aproximar dos seus afetos.

 

No Teatro de Bonecos o ator é também um tipo de poeta e dramaturgo. Os espetáculos são criados a partir da memória e experiência pessoal de cada um. E a memória individual do manipulador vai tocando nas memórias coletivas do público. Este tipo de gênero teatral trabalha com metáforas que fazem pensar, educar e sensibilizar a plateia, com uma nova linguagem na forma de fazer teatro. Os atores estão sempre à vista e são, na maioria das vezes, autores das suas próprias histórias.

 

Há 22 anos a Cia. Gente Falante pratica este tipo de teatro no Brasil. O gênero já possui tradição na Europa, tendo iniciado no começo da década de 1980, na França, a partir de trabalhos desenvolvidos pela artista Katy Deville. Ele não possui uma teoria, mas diversas visões cenográficas e teatrais. Em junho deste ano aconteceu em Florianópolis o Festival Internacional de Teatro de Objetos.

 

No final, a mensagem que permanece é a reflexão sobre as coisas cotidianas e um exercício em ver outras coisas através dos objetos, tocando na intimidade de cada espectador. Um tipo de espetáculo que exige calmaria em tempos de pressa e racionalidade.

 

Velhos Caem do Céu como Canivetes

 

No espaço da Pequena Companhia de Teatro, às 20h, o encontro inusitado entre uma criatura alada e um homem miserável tornou-se o epílogo de uma história sobre exílio, fé e esperança de salvação. O homem questiona-se se está diante de um anjo. O anjo desconhece o homem por suas sujeiras e miserabilidade. Eles se tocam e procuram reconhecer-se um no outro. O homem enaltece a figura alada. Acredita que ele poderia se tornar alguém importante, que poderia instaurar uma nova ordem, uma boa nova. O anjo calcula os dias e anseia pelo momento em que poderá retornar do exílio.

 

Há um jogo de palavras no discurso entre os dois opostos. O homem gosta de ler e usar palavras bonitas. O ser alado solta expressões em língua desconhecida, busca identificações no espaço do quintal do homem. Entre os dois há a sombra da fome, a necessidade de sobreviver. Entre a esperança de um e a resignação do outro há uma disputa. Fica a dúvida sobre quem encerrou seus destinos.

Na programação da Aldeia Sesc, o grupo, formado pelos atores Jorge Choairy, Cláudio Marconcine, e pelo diretor Marcelo Flecha, vai oferecer na cidade de Caxias uma oficina de teatro, no dia 7 de novembro, na Sala de Cultura Martinha Cruz. No mesmo espaço haverá apresentação do espetáculo nos dias 6 (com duas sessões, 19h30 e 20h30) e 7 de novembro (às 20h30).

 

Encontro de chorões

 

A noite foi do choro e da música brasileira na Praça Nauro Machado, a partir das 19h, com os shows do violonista João Pedro Borges e a cantora Célia Maria e o encontro inédito dos grupos Instrumental Pixinguinha e Regional Tira-Teima.

 

A apresentação foi uma reedição do “Recital de Música Brasileira”, projeto realizado há dez anos no Teatro Arthur Azevedo com a apresentação da dupla e um grupo regional de choro.

 

O encontro entre João Pedro Borges e Célia Maria foi dividido em duas partes. No primeiro momento, o violonista apresentou clássicos da canção instrumental brasileira, como Choro Nº 1 (Heitor Villa-Lobos), Tenebroso (Ernesto Nazareth), Interrogando (João Pernambuco) e Choro Triste Nº1 (Garoto). Depois, foi a vez de chamar ao palco a cantora Célia Maria para interpretar canções de grandes compositores da música popular brasileira. Parcerias de Chico Buarque com Tom Jobim (Olha Maria, Piano na Mangueira e Tema de Amor de Gabriela), com João Bosco (Sinhá), com Cristóvão Bastos (Todo Sentimento) e de próprio punho (Velho Francisco), além de canção de Jayme Ovalle e Manuel Bandeira (Azulão) e composição de João Pedro Borges (Porto Errante).

 

Depois foi a vez do time de dez bons músicos de choro comprovar, com muito improviso, técnica e qualidade, porque o gênero é um dos mais valorizados entres os amantes da música popular. O momento foi de descontração. O cavaquinhista Juca do Cavaco falou que não houve ensaio e, por conta disso, o repertório foi alterado minutos antes do show. Cheios de ginga e malandragem os senhores da música instrumental fizeram um espetáculo grandioso, agradando aos mais afinados ouvidos musicais. No repertório, choros de compositores como Waldir Azevedo (Pedacinhos do Céu e Delicado), Jacob do Bandolim (Benzinho e Doce de Coco), Naquele Tempo, Paciente, Cochichando e Proezas de Solon (Pixinguinha), entre outros. Na despedida, ainda coube uma homenagem musical ao clube de futebol Sampaio Corrêa pela conquista na Série B do Campeonato Brasileiro, no sábado (26), com os artilheiros do choro executando com maestria o hino do time.

8ª Aldeia Sesc

A 8ª Aldeia Guajajara de Artes segue até o dia 1º de novembro, em São Luís. Nas cidades de Itapecuru e Caxias, a programação acontece de 03 a 09 de novembro, com oficinas, espetáculos teatrais e shows. A mostra é gratuita, mas o público pode colaborar com o Programa Mesa Brasil do Sesc, que complementa milhares de refeições de crianças e adolescentes de São Luís e Caxias, doando 1 kg de alimento não-perecível nas bilheterias dos teatros.

 

O objetivo do evento é difundir a cultura brasileira e o talento da produção local nas mais diversas linguagens, trazendo espetáculos de circulação nacional e promover a formação de plateia. Este ano o evento passou a se chamar Aldeia, que são as mostras de arte e cultura organizadas pelos Departamentos Regionais do Sesc visando fortalecer os laços comunitários de artistas, espectadores e produtores, buscando inovar e diversificar o circuito cultural brasileiro.